Já fazia quanto tempo desde a morte de Genro? Alguns meses? Não lembrava mais direito, ou melhor, preferia não lembrar. Era engraçado pensar em como apesar de sermos almas essas feridas pareciam doer tanto, era um dor para além de um ferimento, doía como se corroesse nosso interior, era um vazio absoluto, talvez fosse assim que Hollows se sentissem?

De súbito agitava a cabeça afastando aquele pensamento, isso não era coisa que um ceifador deveria pensar, olhava em volta do meu quarto, ou o que era nosso quarto, parecia grande e ao mesmo tempo totalmente vazio. Me levantava, caminhando vagarosamente para meu uniforme, apertava-o e sem forças caia de joelho no chão, tinha falhado como shinigami, tinha falhado com Genro, qual era meu direito em mais uma vez sacar minha zanpakutou?  Olhava de escanteio para o lado e via as vestes dele, na verdade uma veste de cerimonial, usada em nosso casamento, era memórias doces, porém a doçura delas ainda não conseguiam espantar a realidade crua.

“Droga!” Batia com força contra o chão, por que não era mais forte? Se fosse o suficiente provavelmente estariam rindo agora de outro assunto e não estaria sozinha em um cômodo enorme. Amaldiçoava a minha própria fraqueza. Não havia caminho para ir, meu “tempo de licença” já havia esgotado e sendo assim tinha que voltar aos meus deveres, vestia as vestes pretas como se estivesse vestindo uma sentença, pesavam como grilhões, e talvez a única coisa leve era a zanpakutou, uma companheira de outrora e de tempos anteriores até de minha história com Genro.

Com os olhos inchados saia pelo corredor caminhando vagarosa, passo lento, não havia razão para continuar lutando, eu não merecia isso. Então, acabava trombando com outra pessoa, caia para trás de uma vez e via minha papelada espalhar-se a frente. – Me desculpe! Ouvia outra voz feminina vindo de trás, e então me recompunha aos poucos. Levantava conforme podia e ela trazia a papelada entregando-me. – Não vi você andando, a propósito, você está bem? Parece bem cansada. Acabava por ficar um pouco constrangida com a cena, eu tentava sempre buscar o maior padrão de beleza e de postura, mas a forma como estava, de fato, parecia que estava abandonada, uma prova cabal de indisciplina. Ela parecia olhar-me e então era como se sua mente clareasse. – Você é ... Então ela compreendia tudo, tapava a boca por um momento como surpresa e então sabia o que fazer.

- Venha. Sem dizer mais nada, segurava na minha mão e corríamos para um lugar mais afastado dali, era conhecido como um jardim de treino particular, pois apesar de um dojo de luta, era um dojo bem afastado das dependências de treino da sétima divisão. Com o chão de areia e tendo apenas o seu “ringue” isolado por um cordão e árvores, era um lugar calmo e que lembrava um pouco alguns dias com Genro.

- O que você precisa é esquecer, não é? Mesmo que por um momento, precisa esquecer. Dizia ela com um sorriso gentil. – Não sou a melhor com isso, mas sei algo que vai te ajudar, precisa lutar, não podemos nos permitir a ficarmos de cabeça baixa assim tenente Komei. Ela sacava a Zanpakutou e sem avisar avançava em minha direção. Institivamente rolava para a direita, mas ela era rápida, ela avançava novamente e como resposta eu levava a bainha da zanpakutou contra a lâmina, travamos por um minuto em uma disputa de força, minha zanpakutou na horizontal ainda dentro da bainha e ela forçando a lâmina contra o meio. De começo parecia conseguir, mas conforme os segundos avançavam a força aumentava e sem opções novamente rolava para o lado. Ela era implacável, e a cada vez seu ritmo aumentava, aquela moça queria reanimar-me pelo método de luta, passava a lâmina por baixo e por resposta eu era obrigada a pular.
Sentia a respiração aumentar, a mente começava a esvaziar, era como se ela tentasse me forçar a focar novamente, e se eu não prestasse atenção iria me machucar. Fazia tempo que não voltava a minha velocidade no auge, tinha ficado meses deitada, meses deprimida, e o corpo cobrava seu preço por isso, era como se ela estivesse forçando meu corpo a retomar sua velocidade. O ritmo aumentava e agora tornava-se uma briga de espadas rápidas, no começo claros encontro de lâminas, depois sombras e agora apenas vultos através do Shunpo.

A luta terminava algo em torno de 3 segundos e terminava comigo caída no chão e a lâmina daquela mulher apontada contra meu pescoço. Respirava pesadamente, ofegante, o suor escorrendo pelo rosto, não me sentia assim desde quando? A quanto tempo tinha me desafiado a tanto? Sentia que a régua agora estava em outro nível, ela havia elevado. – A propósito, meu nome é Igarashi Aika.

E então, essa era a primeira vez que havia conhecido a mulher que seria a sucessora da sétima divisão.

Uma ou duas semanas tinham-se passado desde aquele encontro com Aika, a curiosidade ainda percorria minha cabeça a respeito daquele treino, de fato aquela energia tinha a levantado por aqueles dias. E de certa forma era quase como um vício, precisava de mais. As vezes, atrevia-se andando pelo corredor apenas para acha-la e então encontrava-a em um dos corredores. Parava a frente dela, e ela perguntava-se por um momento o porquê daquela intromissão. Então, parecia que ela entendia em um lampejo o motivo. Um sorriso um pouco sarcástico surgia no rosto dela e sem falar mais nada saia caminhando em direção do mesmo jardim.
- Hoje, vamos ver o quanto você é forte. Falava ela sacando a espada, então seria um teste de força, dessa vez não dava a mesma brecha, sacava a minha zanpakutou e a empunhava colocando a base dos pés oposta à dela.

Então, ela avançava, institivamente levava minha lâmina para perto, buscando bloquear, conseguia segurar o primeiro, ela rapidamente levava a espada acima como se fosse o golpe de um martelo, imediatamente fortificava minha base segurando, ela vinha mais forte e eu segurava pela terceira vez. Sem pensar ela mudava a posição do ataque e me obrigava a rolar para o lado. Diferente de antes, aproveitava o momentum para avançar contra ela com um pulo tentando acertar de forma descendente acima da cabeça, ela bloqueava e pela primeira vez a via ter que colocar a mão embaixo da lâmina para segurar.

Aika sorria e assim ela desviava o golpe, voltando para atacar com velocidade, começava uma briga de golpes com força para tentar arrancar a espada da mão, e então levava a espada para cima, bloqueando-a com a espada a frente, a outra lâmina batia contra a minha e tratávamos, agora em uma batalha de força. Ela tentava jogar o peso para a frente, eu fazia o mesmo, o suor escorria do nosso rosto e cada movimento fazia nossos pés afundarem mais no chão, estávamos começando a brigar sério, era como se você tentasse empurrar um peso gigantesco contra si, tal qual um movimento em um treino com pesos, nossa disputa era força pura.
Começava a respirar ofegante, ela pelo menos, o chão começava a rachar conforme íamos aumentando a pressão e a força. A briga se arrastava por alguns segundos, o braço começava a doer pela exaustão e então eu era a primeira a ceder, defendia com dificuldade mais uma investida, mas na segunda era tarde demais, ficava desarmada e novamente caia no chão.

A mulher sorria e ofertava a mão para que eu me levantasse, aceitava ainda sentindo o ardor nos braços. – Você melhorou, talvez até um pouco melhor do que antes do incidente, não se apresse e não se preocupe.

Ela então guardava a zanpakutou, eu fazia o mesmo. Aika movia-se para sentar-se na beirada do píer do dojo e eu ao lado dela. – Tenho algo para lhe contar, a partir do próximo semestre vou ser nomeada a nova capitã da sétima divisão, espero que não me odeie por isso, Genro Shinra foi um capitão exemplar, eu planejo honrar seu legado. Eu abaixava meu olhar, pensativa sobre tudo aquilo, é natural que haveria a sucessão de Genro, e quanto mais rápido melhor, afinal uma divisão sem líder criava muitos perigos. Compreendia ela e a decisão de Ayatto. Então, afirmava com a cabeça e tinha noção que com a força dela ela seria capaz de zelar pela sétima. – A propósito, trarei um novo tenente, ele é promissor, mas eu tenho que ficar de olho nele, peço que também tenha zelo por ele Komei, ele pode desencadear uma tempestade, mas ao mesmo tempo pode ser uma força no meio da escuridão e para nós isso é importante. Seu nome é Yuichi Yukimura.