Desde muito cedo aprendi que treinos não deveriam ser algo padrão. Talvez isso seja um pouco óbvio quanto se pensa em um shinigami e todas suas minucias; alguém pertencente à segunda divisão geralmente faz parte da onmitsukido e busca focar em treinos físicos, de velocidade, sempre em busca de maneiras para manter a furtividade e alcançar seus objetivos. Membros do décimo primeiro esquadrão são focados no combate direto e naturalmente buscam focar em sua força, resistência e o combate com espada. Cada um sempre busca aprimorar-se de modo a trazer a força que guarda dentro de si para fora. Acredito que a ideia de trazer o que existe dentro de você para fora muitas vezes é exatamente o que reflete quem eu sou. O grande ponto é que a única forma de encontrar isso é olhando para dentro.

Sentado em meus aposentos, com os olhos fechados, eu buscava enxergar o que repousava sob a superfície. Apesar de saber que eu nunca estava em risco em meu mundo interior, nunca sabia o que esperar. Aquela voz, que sempre me acompanhava, era astuta; seus métodos nunca eram habituais e, apesar de saber isso, nunca devia achar que sabia como seria.

Dessa vez meu coração parou por um segundo. Não havia solo, porém eu não conseguia me manter em pé. Em queda livre eu ouvi seus sussurros: “Você não deve temer o que jaz abaixo”. Enxergando a claridade cada vez mais longe acima de mim o abismo me engolia. “Foco. Sua curiosidade te levará à ruína. Suas tolices te levarão a um momento onde não haverá uma chance de voltar atrás; a responsabilidade está sob seus ombros... Aika se foi”. Minha expressão facial se enrijeceu ao ouvir as palavras que vinham do fundo de minha mente. Ela sabia como tocar em meus pontos fracos; esse tom indelicado era realmente necessário? Limpei minha mente e finalmente consegui me equiparar com o que me cercava; só havia escuridão, sem mais espaço para bobagens. Enquanto o ar gelado corria por meu corpo em meus ouvidos era como se uma orquestra começasse a tocar, a crescer e eu finalmente me endireitava; mergulhava rumo ao desconhecido abaixo. Eu não sabia o que esperar, mas confiança era necessário. Independentemente do que estivesse ali, era uma parte de mim; eu deveria abraçar.

Algumas pessoas no mundo humano dizem que se você olhar para o abismo ele te olha de volta. Talvez era isso que ela buscava de mim. Conforme eu caia mais escuro ficava, mas não me amedrontava. O frio me cercava e se intensificava enquanto eu descia, mas a escuridão parecia interminável abaixo. Novamente fechei meus olhos e me concentrei. Repeti as palavras que antes me foram ditas mentalmente e era difícil pensar no que fazer, mas algo em minha mente tentava trazer clareza. Por um segundo o barulho de vento cessou; abri os olhos e lá estava eu, frente a imponente fortaleza que me fora apresentada centenas de anos atrás. Esperei algo; uma palavra de afirmação, talvez até uma parabenização, mas... Aika me acostumara mal, ela era diferente.

Por fim, apenas o vento era audível pelos paredões escuros que me cercavam. Em um piscar de olhos eu estava de volta a meus aposentos. Nunca era fácil dizer se aquele tipo de treinamento funcionava, mas os resultados já haviam se confirmado antes, então não havia porque duvidar, afinal, ela sempre tinha um propósito.

Considerações: