A movimentação por toda a dimensão do Hueco Mundo poderia ser sentida em praticamente qualquer lugar do Las Noches, caso a pessoa fosse capaz de entender e sentir o mínimo sobre a reiatsu dos outros. Por causa disso, todas as divisões passavam a se mover dançando sobre o que parecia ser a maior performance que ocorreria naquele lugar desde décadas e anos em paz. A verdade assolava o novo reinado de Denki, marcado por uma guerra sanguinária que deixou a reputação dos Hollows e seus estereótipos ainda mais expostos a qualquer um que resolvesse adentrar ao castelo. Os desaparecimentos estavam sendo cada vez mais frequentes e faziam com que ambos os lados de suas respectivas distopias entrassem em um certo nível de estresse e preocupação. Tal que fizessem, talvez, que a paz entre o Hueco Mundo e a Soul Society pudesse ser fragmentada em pedaços, apesar de tantos dias sem um digno confronto.

   Para Kana aquilo representava uma oportunidade única para exercer sua raiva sobre os Deuses da Morte sem quase nenhuma penalidade amordaçada por tratados acima de seu controle. Era simples, caso fosse decretado paz haveria paz e ela estaria limitada a agir, por saber que seria punida por causa disso. Contudo, nem tudo pode ser lido no preto e no branco, e ela sabia muito bem como reverter esse tipo de cenário, bastaria um movimento e tudo poderia entrar pelos ares, mas para isso, era necessário que estivesse pronta. O melhor que pudesse. Já que, assim como ela, não esperaria nem misericórdia nem mesmo fraqueza daqueles que ela tanto odiava.

Considerações:

Pelo castelo, sabia que precisaria de mais tempo para poder se concentrar naquilo que realmente importava, algo que iria trazer para ela o poder necessário para atravessar as barreiras da sua vontade, e transformá-la em realidade. – Eles já estão aqui, e eu posso sentir a sua ameaça a essa dimensão. – Contemplava de seus aposentos no castelo, já que pode sentir os tremores de reiatsu e sua densidade no deserto, e assim como pressentia sua movimentação pelo castelo. Seus braços arrepiava só de pensar que o verdadeiro momento para um evento tão importante já estava ocorrendo, que ele havia enfim começado e que todo o seu antigo trabalho lhe proporcionaria frutos. No mínimo, seria capaz de combater um deles de frente, sem medo de perder ou de não possuir o findável para garantir sua vitória.

– Eu preciso me superar e aprender a controlar este poder que orbita o meu corpo, que faz minha respiração sufocar qualquer cansaço. – Olhando por uma pequena janela de vidro, que reluziria pelo lado de fora como um pequeno ponto branco de luz. Ela sabia o que precisaria fazer e estava pronta para fazer o que fosse preciso para afunilar seus erros e superar a forma bruta que erguia a sua espada. – Não há tempo a perder, não aguento ficar aqui parada sem fazer nada, enquanto esses tolos entram pelo Hueco Mundo a ponto de pensarem estar em casa. Como se fizessem um passeio pelo jardim da Soul Society. – Sentia um certo desgosto por uma atitude tão premeditada como aquela, um ato completamente desfavorável a eles e sentia um sentimento de despreparo pelos capitães que tinham acabado de chegar.

Considerações:

   Com passos rápidos, conhecendo a arquitetura do castelo o suficiente para que pudesse se mover com eficiência por dentro de sua estrutura, foi em direção a uma região mais reservada, com espaço suficiente para que pudesse praticar sem medo de ser encontrada ou que causasse distúrbio notável pelas paredes de concreto. A movimentação pelos labirintos era verdadeiramente assustadora, a quantidade de fracciones que viu superava todo o seu tempo em que tinha passado pelo Las Noches. – É impressionante, como que de repente, todos os ratos saem das tocas. Inundados pela enchente que está por vir. – Kana sabia que tudo aquilo era derivado da invasão que estavam tendo, em prol da reunião efetiva dos líderes de dimensões.
   
    – Eu não vou deixar que eles tomem o Las Noches, se acham que vão fazer o mesmo que fizeram comigo, estão muito enganados… –  Já dentro da câmara onde poderia treinar, a sua frente se depararam bonecos de pedra esculpidos sob um dos materiais mais duros que se podiam encontrar no Hueco Mundo. Era algo que ela havia pedido exclusivamente para os Fracciones da sua divisão e que construíssem, para ela, algo que a fizesse sofrer para cortar. Seu desafio era simples, porém muito trabalhoso porque pedia de si mesma uma precisão incontável, já que aquele material requeria uma angulação de corte muito específica para que pudesse ser fatiado.

Considerações:

   Ataques simples, sem nenhuma técnica e com o foco exclusivo em ajustar o sentido do ataque faziam o corte sem muitos problemas. Isso era óbvio, já que toda a atenção estaria direcionada a esse tipo de detalhe, mas como todos que já participaram em uma luta sabem, se isso não for algo intuitivo você provavelmente não vai conseguir ganhar uma batalha que envolve inúmeras variáveis ao mesmo tempo. É a mesma coisa que atirar em um projétil parado e acertar um que está em movimento, tomando cobertura, disparando de volta, se tornam duas situações completamente diferentes. – Não deve ser tão difícil assim, eu consigo facilmente quebrar o Las Noches inteiro se eu quiser, isso não deve ser maior do que isso.  – Subestimando a dura pedra que jazia à sua frente, foi com tudo em direção ao primeiro manequim rochoso, acertando-o com brutalidade através de suas duas espadas.

    Uma explosão recobriu o ambiente, enviando a espada a metros de distância com o seu próprio corte, revidando toda a força que ela havia depositado nas suas armas. Foi impressionante, e talvez fosse um pouco otimista pensar que ninguém no castelo iria ouvir esse tipo de estrondo. Contudo, o objeto permanecia intacto, apenas com uma leve parte marcada com um arranhão superficial. Kana se chocou contra uma das paredes, gerando uma pequena cratera que se fraturou no concreto em que aterrissou. Se não fosse pela incrível resistência da Espada, provavelmente teria se machucado feio, já que estava lidando com uma parte significativa da sua força, que havia sido refletida.

Considerações:

     – Puta… merda.  – Suspirou um pouco ofegante, principalmente por não esperar que esse tipo de reação iria acontecer, nunca havia lidado com algo tão estranho na sua vida, ainda mais vindo de um objeto inanimado. Por mais que tivesse certo raciocínio lógico, esse não era muito o seu forte, o que a fazia não ser muito capaz de entender o que havia acontecido. Tinha o conhecimento sobre o objeto, de forma básica, contudo não era capaz de explicitar em palavras o motivo do que enxergava a sua frente.  – Parece que os rumores eram verdade, tenho que te macetar com jeitinho.  – dizia, como se estivesse a conversar com uma pessoa, ou algo que pudesse simplesmente entender suas palavras, apesar de ser uma rocha sem boca nem ouvidos. A primeira coisa que precisava fazer, mesmo que fosse considerado o mais fácil de se alcançar, era separar o material em dois com golpes mais diretos.

    Para isso, resolveu diminuir um pouco o impacto do que estava fazendo, para que pudesse se manter ao menos em pé, depois de errar como da última vez. Devido a isso, se aproximou do pedregulho em formado minimamente semelhante a de um humanóide e tentou encostar a lâmina de sua espada direita na margem do mineral. Tinha o mesmo efeito que a água tem com o óleo, como se fosse impermeável a sua espada, não procurando sequer desgastar com sua zanpakutou. Ao inserir um pouco de pressão, podia sentir que recebia em uma certa proporção, a mesma reação em retorno, algo intrinsecamente interessante. Porém, não era capaz de perceber a importância que isso tinha a longo prazo. Não era mesmo o importante, apenas que pudesse aperfeiçoar suas técnicas, e assim resolveu atacar mais uma vez o objeto.

Considerações:

    Sendo empurrada para o lado, Kana acabou cedendo ao movimento, e foi impelida a girar pelo ar por causa do arraste que havia sofrido. Seu golpe lateral envolvia um momento resultante sobre seu eixo, e a fazia perder o equilíbrio facilmente. Desta vez, no entanto, estava esperando algo do tipo e pode ajustar seu corpo enquanto realizava sua trajetória, planejando sua aterrissagem com perícia, do que apenas ser jogada como uma mera boneca. – De novo não, agora eu já sei dos seus truques. Foi uma ótima ideia pedir isso aos meus subordinados. – Com o passar do tempo, pequenos ajustes foram sendo realizados pouco a pouco, mesmo que inconscientemente, nos ataques da Espada, conforme golpeava incessantemente o material. De certa forma, sempre foi uma pessoa que se esforçava e muito para alcançar os seus objetivos, mesmo que impaciente com a maioria das coisas. Pelo menos, era o que se podia dizer de sua época como Shinigami, hoje atuando como um Hollow, ainda retia parte disso em si mesma.

    Enfim, passou a cortar aquela rocha com certa intuição, depois de inúmeros erros cometidos durante os golpes, e era isso que almejava alcançar a longo prazo. Em uma batalha, esse tipo de habilidade seria constantemente testada, e de certa forma não seriam admitidos erros como estavam ocorrendo naquela hora. – Não sei se sinto alguma diferença.. Será que estou mesmo percorrendo meus limites? – pensou com certo receio, algo que a menina tinha de sobra quando se tratava da sua força. Inúmeras vezes perguntava a si mesma se aquilo teria de fato algum propósito, já que odiava perder tempo com coisas que não fossem verdadeiramente úteis.

Considerações:

    Depois de se perder um pouco sob seus pensamentos, enquanto avaliava a clareza de suas lâminas sob a rocha, entendeu que aquilo se trataria de um processo e, durante ele, a evolução era contínua e difícil de se perceber por dentro. Talvez, se estivesse sendo observada por algum espectador ou pessoa externa, este poderia validar suas suspeitas de um crescimento pessoal, mas aquele não era o cenário que se encontrava. Finalmente possuía a destreza suficiente para que conseguisse realizar os mais simples ataques sobre a dureza do mineral. Ela não podia se dar ao luxo, contudo, de demorar mais do que já estava levando, por causa do seu chamado à reunião dos Espadas. De certa forma, poderíamos considerar um tempo pequeno desde que começou a treinar e a chegada dos Shinigamis, mas ainda assim o suficiente para que se preparasse ainda mais. Eles precisaram entrar no Hueco Mundo e ainda se locomover para o castelo, e este era um tempo precioso que ela não estava disposta a perder.

    – Já chega dessas futilidades, está na hora de testar minhas técnicas, seria tão diferente do que acertar o que eu já consigo? – Se questionava, mal sabendo ela de que era completamente diferente. Dispender do foco com uma técnica minimamente elaborada e o ajuste dos ataques para conseguir penetrar na superfície extremamente rígida do material eram coisas completamente análogas. Uma iria retirar a capacidade da outra, a não ser que o usuário partisse uma evolução com a espada, para que pudesse depender da sua concentração apenas em uma delas. Em prol desses preceitos, Kana sussurrou consigo mesma, conforme se posicionou pra pular acima do material. – Despedaça meu inimigo… Suikawari!!

Considerações:

    Manter-se equilibrada durante a trajetória e realizar o ataque de forma a permanecer com o fio do corte limpo era extremamente mais complicado do que apenas atacar o adversário que possuía a sua frente. Percebendo esse tipo de diferença, Kana imediatamente notou que não podia subestimar aquele tipo de ação, porém já era tarde demais. Se chocando contra o objeto, a explosão se fez ainda maior, contra o movimento que ela havia aplicado nele, enviando suas espadas para longe. Mesmo tendo-as soltado de suas mãos, parte da energia ainda foi transmitida pelo seu braço, lhe causando uma dor significantemente alta, ainda que houvesse sob sua pele uma grande resistência. Gemeu de dor. Sob a sala cintilou o barulho do metal acertando o chão até parar de vez no canto da sala, a iluminação não era a das melhores, com uma luz pálida por todo o ambiente. Ajoelhou-se com a mão esquerda sob a direita, apertando onde a dor era mais severa, fechando os olhos e expressando lamentação em sua face.

    Apesar da dor, foi capaz de se levantar com cautela, enquanto se dirigiu até o lugar em que suas duas espadas haviam sido arremessadas. – P-parece que eu… Não aprendi a lição ainda, não é, Mizuki? – Falava consigo mesma, remetendo ao nome de sua falecida irmã, como se ela pudesse a ouvir. Em seus olhos remeteram ao mesmo tempo a raiva e a tristeza de não poder vê-la mais uma vez, e naquele purgatório mental redigiu suas frustrações ao que havia passado por causa da Soul Society.

Considerações:

    Em seus olhos restavam apenas o brilho de uma alma atormentada por coisas que nem mesmo teve controle. Tudo até agora em sua vida havia sido uma combinação de azar, talento e infortúnio, mas mesmo assim não foi motivo para que ela não tivesse sua própria influência no seu destino. Na verdade, mesmo que não soubesse, não teria se tornado Arrancar se não tivesse batalhado muito durante a Hollowficação, muito menos se não possuísse dentro de si um lado muito poderoso relacionado aos Hollows. Talvez fosse por isso, que havia sido procurada pelo cientista a vários anos atrás, e por isso foi resgatada dos submundos do Roukugai para ser registrada como uma Shinigami. Nem mesmo ela poderia acreditar mais nisso, que havia efetivamente feito parte de tudo aquilo no seu passado como Deusa da Morte. Por essa traição, criou-se um oponente formidável do lado dos Hollows, e a Central 46 estava cada vez mais menos ciente disso, por abafar o caso envolvendo sua transformação.

    – Chega disso, eu cansei de perder o meu precioso tempo com algo tão simples. – Por mais que mentisse, havia uma certa sinceridade em suas palavras, agora ela estaria dedicando cada parte do seu corpo e da sua alma naquele treino antes de prosseguir para a sala de reunião dos Espadas. Se reuniu mais uma vez com sua Zanpakutou, que não mais se conectava espiritualmente com ela, apesar de seus antigos esforços. – Guerrilla, eu sei que um dia… vou poder usufruir do seu poder de novo. – Queixava-se, solitária, naquele ambiente recluso em que não deveria ser interrompida por nenhum outro subordinado. Flexionando seus pés, preparando para deferir mais alguns ataques contra o objeto, se preparava para os impactos a cada vez que os realizava. Um atrás do outro, uma série de golpes foi deferida naquela sala, demonstrando um aperfeiçoamento a cada tentativa.

    Eventualmente, pode sentir sua lâmina se acostumando cada vez mais com a situação e dureza do material que investia sem medo. Os danos percorriam cada vez com menos significância e pode perceber que, depois de usar seu arsenal de habilidades várias e várias vezes, se acostumava gradativamente com suas técnicas. Isso era algo que ela não havia percebido muito, até agora, a dependência que tinha em prestar atenção em seus movimentos. Apesar da tremenda força e da sua incrível capacidade física, se sentia agora como um minério metálico, pronto para ser refinado e enriquecido. Seus movimentos eram cheios de potencial, mas lhe faltavam o controle necessário para torná-los ainda mais letais.

Considerações:

    Ao fim de seu combate intermitente, marcado por um esforço mental exaustivo e uma resistência física impressionante, Kana havia completado a missão que havia passado a si mesma. Naquele lugar, depois de inúmeras tentativas, finalmente havia sido capaz de controlar suas técnicas a ponto de conseguir cortar os manequins com o material extremamente reativo a esforços mecânicos. Podia sentir o dilatar de seus músculos, acompanhados pela tremenda dor de cabeça que sentia naquele momento. Suas adagas não estavam fissuradas, muito menos desgastadas, mas todo esse desgaste se refletia na própria mulher. Precisava se retirar e retomar seu fôlego dentro do Las Noches, antes que pudesse se tornar presente na reunião. Mal sabia se havia de fato começado ou não, mas pelo tempo que havia passado ela com certeza estaria atrasada, e para isso poderia representar um problema a hierarquia que era imposta.

    – Não acredito que possa demorar mais do que já passou. Preciso me recuperar e ir imediatamente ao chamado do Rei. – Sabia de antemão que não podia demorar mais, apesar de seu cansaço e dedicação, ela tinha deveres que estavam sendo majoritariamente requisitados. O número 4, exposto em seu pescoço, não era um simples enfeite, e precisava agir de acordo com ele, mas ainda além desse dever tinha o tremendo saciar de seu encontro com os Shinigamis que nunca mais havia visto. Para isso, deixou os destroços fatiados em inúmeros pedaços na sala oclusa, e se direcionou aos seus aposentos mais uma vez, para que pudesse descansar brevemente e comparecesse ao evento de reunião.

Considerações: